Paisagem Madura
(A meu pai)
As goivas desenham
na sola da vida um poema,
e os sulcos cravados na memória
se alastram feito galhos secos
no outono da profissão.
A mesa posta: o couro, o cutelo,
as correias, aços curvos, sombrios,
e o silêncio do martelo
de madeira, gasto pelo ofício
de martelagoivar.
Na aresta do tempo
gravou-se a imagem e o suor
do seleiro, poeta e seresteiro,
alfaiate dos animais.
Imagem simples, sertaneja,
solidária da peonada,
hoje vestida de solidão.
Os pensamentos, fios contorcidos,
perdidos na cera da lembrança,
apertam o coração na tala do peito
e pairam diante da sovela fina
da saudade, trespassando
com um par de agulhas dos olhos
a sola macia do infinito.
Maurício Apolinário
Enviado por Maurício Apolinário em 06/06/2007
Alterado em 18/06/2007
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